Diferentes horários = diferentes resultados?
- Carolina Preto
- há 6 dias
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A prática regular de exercício físico está ligada a inúmeros benefícios para a saúde, como a melhoria da composição corporal, o aumento da força muscular, a redução do stress e a prevenção de doenças crónicas.
No entanto, a pergunta que se coloca é: o horário do treino influencia os resultados? A ciência sugere que sim e essa influência pode depender de vários fatores.
Diversos estudos científicos têm investigado o impacto do ritmo circadiano — o “relógio biológico” interno — na performance física, na hipertrofia muscular e na queima de gordura. Ainda assim, os efeitos podem variar de acordo com o objetivo individual e o cronotipo de cada um. Será possível (ou até desejável) ajustar o nosso ritmo circadiano às exigências da vida pessoal, profissional e socioeconómica? Esta questão complexifica o debate e levanta reflexões importantes, que iremos abordar ao longo do artigo.
Ritmo circadiano e desempenho físico
O corpo humano opera com base no ritmo circadiano, um ciclo de 24 horas regulado principalmente pela luz solar. Este ciclo tem a capacidade de influenciar processos fisiológicos como a temperatura corporal, os níveis hormonais e o alerta mental.
Vários estudos demonstram que a temperatura corporal tende a atingir o pico ao final da tarde (entre as 16h e as 20h), o que pode otimizar o desempenho físico por melhorar a mobilidade, a força muscular e a eficiência metabólica (Chtourou & Souissi, 2012).
Além disso, a disposição para treinos intensos pode ser menor pela manhã, especialmente em indivíduos com cronotipo vespertino, que iremos aprofundar de seguida.
Contudo, apesar desses benefícios fisiológicos potenciais, nem todos têm a liberdade de adaptar os seus treinos ao ritmo circadiano “ideal”. Muitos trabalham em horários fixos, estudam à noite ou cuidam de familiares, tornando impossível treinar no horário mais eficiente do ponto de vista biológico.
Aqui, surge o dilema: devemos adaptar o nosso ritmo circadiano às exigências externas, ou adaptar o treino à nossa realidade?
Cronotipos
Chamamos cronotipo à predisposição natural de cada pessoa para sentir picos de energia ou cansaço em diferentes horas do dia. Há vários tipos de cronotipos:
Cronotipo Matutino - os early birds, que tendem a ter mais energia e ser mais produtivos pela manhã. Os indivíduos com este cronotipo tendem evidentemente a sair-se melhor em treinos pela manhã (Facer-Childs et al., 2015);
Cronotipo Vespertino - habitualmente designados night owls, que tendem a ter mais energia à noite e, por isso, também os treinos tendem a demonstrar um melhor desempenho ao final do dia;
Cronotipo Intermediário - este tipo de pessoas tem um padrão mais flexível, sentindo-se bem tanto de manhã como à noite e as horas de sono podem variar, assim como a sua predisposição para os treinos.
Embora os cronotipos sejam em grande parte genéticos, há alguma plasticidade circadiana. Através de consistência, exposição à luz, hábitos de sono e alimentação, podemos ajustar ligeiramente o nosso ritmo biológico — mas isto tem limites, sobretudo se for feito em confronto constante com o estilo de vida real.
Por exemplo: um indivíduo vespertino forçado a treinar às 6h da manhã por causa do trabalho pode sentir menos energia, o que reduz a eficácia e o prazer do treino. Por outro lado, insistir num treino noturno quando isso prejudica o sono pode trazer efeitos negativos a longo prazo.
É neste equilíbrio que entra a noção de sustentabilidade.
Composição corporal e resultados físicos
E quanto à perda de gordura? A perda de gordura corporal parece não ser significativamente afetada pelo horário do treino. O mais importante é o gasto calórico total, a intensidade e a frequência do exercício. Um estudo publicado no Journal of Obesity (Willis et al., 2012) mostrou que indivíduos que realizaram exercícios aeróbicos em horários variados tiveram resultados semelhantes na perda de gordura corporal.
Um estudo de Kuusma et al. (2016) comparou grupos que treinaram de manhã e à tarde, durante 24 semanas. Ambos apresentaram aumento de força e massa muscular, ainda que o grupo da tarde tenha tido ganhos ligeiramente maiores em hipertrofia. Isto indica que treinos à tarde/noite podem ser levemente mais eficazes para ganhos de força e massa magra, mas essa vantagem é pequena e pode não justificar mudanças drásticas na rotina.
Contudo, há outros fatores, como a qualidade do sono e a alimentação, que podem ser mais relevantes do que o horário do treino isoladamente.
Mais uma vez, o que se destaca é: vale a pena sacrificar a saúde mental, o sono ou o equilíbrio vida-trabalho para treinar no “melhor” horário?
Consistência
Um fator importante é a consistência no horário do treino. Um estudo publicado no Journal of Strength and Conditioning Research (2016) mostrou que indivíduos que mantêm o mesmo horário de treino têm maiores ganhos de força e melhor desempenho do que aqueles que treinam em horários variados. Isto porque o corpo acaba por se adaptar ao horário habitual de exercício e por outro lado, se variarmos frequentemente o horário podemos estar a dificultar a adaptação do corpo.
Isso deve-se à adaptação do organismo ao horário habitual de exercício — tanto a nível hormonal como comportamental.
Com isto, podemos concluir que a regularidade supera o timing. O melhor horário para treinar é aquele que conseguirmos manter consistentemente. Se o treino matinal é o único viável nos nossos horários, então é o mais eficaz para nós — mesmo que a ciência aponte pequenas vantagens para outros horários.
Conclusão
Sim, o horário do treino pode influenciar os resultados, mas essa influência depende de múltiplos fatores de igual (ou até maior) importância:
Objetivo individual (perda de gordura vs. ganho de força/massa muscular);
Cronotipo e estilo de vida;
Qualidade do sono, alimentação e stress;
Consistência no horário do treino;
E sobretudo: das condições pessoais, profissionais e socioeconómicas.
A ideia de que devemos ajustar o nosso ritmo circadiano à nossa realidade é válida até certo ponto — pequenas adaptações são possíveis. Mas tentar forçar o corpo a operar contra o seu relógio biológico, apenas para encaixar num ideal teórico, pode gerar mais prejuízos do que benefícios.
Mais importante do que encontrar o melhor horário absoluto, é importante escolher um horário que possamos manter a longo prazo e com regularidade, respeitando o nosso ritmo biológico e rotina pessoal.
Referências
Chtourou, H., & Souissi, N. (2012). The effect of training at a specific time of day: a review. Journal of Strength and Conditioning Research, 26(7), 1984–2005.
Facer-Childs, E. R., et al. (2015). Circadian phenotype impacts the brain’s resting-state functional connectivity, attentional performance, and sleepiness. Scientific Reports, 5, 11487.
Sedliak, M., et al. (2009). Effects of time-of-day-specific strength training on muscular hypertrophy and strength. Chronobiology International, 26(3), 576–592.
Kuang, J., et al. (2022). Exercise training and time of day: Effect on physical performance and health outcomes. Frontiers in Physiology, 13.
Hill, D. W., Cureton, K. J., Collins, M. A., & Grisham, S. C. (1998). Diurnal variations in responses to exercise of "morning types" and "evening types". Journal of Sports Medicine and Physical Fitness, 28(2), 213-219.
Kuusma, M., Ahtiainen, J. P., Häkkinen, K. (2016). Strength training in the morning or evening – does it matter?. Chronobiology International, 33(4), 393–405.
Willis, L. H., Slentz, C. A., Bateman, L. A., Shields, A. T., Piner, L. W., et al. (2012). Effects of aerobic and/or resistance training on body mass and fat mass in overweight or obese adults. Journal of Obesity, 2012: 1–10.
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