A ilusão do peso ideal
- Carolina Preto
- há 21 horas
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Quando o objetivo é emagrecer, a maioria das pessoas pensa imediatamente em reduzir o número que aparece na balança.

No entanto, emagrecer significa reduzir a gordura corporal — e não apenas perder peso total. A redução do número na balança pode refletir perda de massa muscular, massa óssea, água e outros tecidos, para além de gordura corporal (Hall et al., 2012).
Um processo de emagrecimento bem-sucedido, sobretudo a médio e longo prazo, é aquele que permite preservar a maior parte da massa magra, enquanto se promove a redução da gordura corporal. De forma geral, considera-se uma perda de peso metabolicamente saudável quando mais de 80% da massa perdida corresponde a massa gorda (Weinheimer et al., 2010).
Quando o treino de força não faz parte do processo, e a alimentação apresenta um teor insuficiente de proteína e energia face às necessidades da pessoa, o risco de perder massa muscular é significativamente maior — e com ele aumenta também o risco de reganhar a gordura perdida, ou até ultrapassar os níveis anteriores (Stokes et al., 2018).
O IMC é um bom indicador?
O Índice de Massa Corporal (IMC) é uma ferramenta amplamente utilizada em saúde pública para estimar se uma pessoa tem um peso adequado em relação à sua altura. Contudo, o seu uso isolado em contexto individual é limitado, pois não distingue entre massa magra e massa gorda, nem considera a distribuição da gordura corporal (Nuttall, 2015).
O conceito de “peso ideal” está frequentemente associado ao IMC, com os valores “normais” entre 18,5 e 24,9 kg/m². Embora estas categorias sejam úteis como referência populacional, tornam-se problemáticas quando se pretende que todas as pessoas se enquadrem nesses valores, ignorando fatores como genética, estrutura corporal ou historial clínico.
Além disso, a ideia de que pessoas com IMC dentro dos valores “normais” são automaticamente mais saudáveis tem vindo a ser contestada. Vários estudos revelam que um estilo de vida ativo e uma boa aptidão cardiorrespiratória são melhores preditores de saúde do que o IMC isoladamente (Barry et al., 2014; Lee et al., 2011).
Por exemplo, pessoas com IMC superior a 30 — classificadas como tendo obesidade — mas com boa funcionalidade física e estilo de vida ativo, apresentam menor risco de mortalidade por todas as causas do que pessoas com IMC dito “normal”, mas com estilo de vida sedentário e hábitos poucos saudáveis (Lavie et al., 2015).
É importante sublinhar que isto não significa que o excesso de gordura não tenha riscos, mas sim que o comportamento tem um impacto modificador muito relevante. E, em muitos casos, a redução de massa gorda através de mudanças comportamentais positivas, especialmente quando associadas a uma dieta com redução calórica, podem ser um fator de proteção adicional.
Peso ideal… para quem?
As mulheres, em particular, são um grupo especialmente vulnerável à maneira como o conceito de “peso ideal” é transmitido culturalmente. Desde cedo, a pressão estética molda o olhar sobre o corpo, o que promove um ideal muitas vezes irrealista — através do vulgo "corpo de revista" — e contribui para uma relação menos saudável com a alimentação.
Talvez esteja na altura de mudar o paradigma de “perder peso” para “ganhar saúde”.
Num mundo que constantemente tenta-nos vender a ideia de que peso e saúde têm uma relação direta de causalidade — quando raramente é o caso — é essencial estarmos conscientes do nosso papel, enquanto profissionais e cidadãos. Esta mudança de perspetiva exige também uma transformação social, em que a pressão estética perde relevância e ganha preponderância uma visão mais funcional, sustentável e inclusiva de todas as formas e feitios do corpo humano.
Referências
Barry, V. W., Baruth, M., Beets, M. W., Durstine, J. L., Liu, J., & Blair, S. N. (2014). Fitness vs. Fatness on All-Cause Mortality: A Meta-Analysis. Progress in Cardiovascular Diseases, 56(4), 382–390. https://doi.org/10.1016/J.PCAD.2013.09.002
Hall, K. D., Heymsfield, S. B., Kemnitz, J. W., Klein, S., Schoeller, D. A., & Speakman, J. R. (2012). Energy balance and its components: implications for body weight regulation. The American Journal of Clinical Nutrition, 95(4), 989–994. https://doi.org/10.3945/AJCN.112.036350
Lavie, C. J., De Schutter, A., & Milani, R. V. (2015). Healthy obese versus unhealthy lean: The obesity paradox. Nature Reviews Endocrinology, 11(1), 55–62. https://doi.org/10.1038/NRENDO.2014.165;SUBJMETA=2743,393,499,692,699,75;KWRD=CARDIOVASCULAR+DISEASES,OBESITY,RISK+FACTORS
Lee, D. C., Sui, X., Artero, E. G., Lee, I. M., Church, T. S., McAuley, P. A., Stanford, F. C., Kohl, H. W., & Blair, S. N. (2011). Long-term effects of changes in cardiorespiratory fitness and body mass index on all-cause and cardiovascular disease mortality in men the Aerobics Center Longitudinal Study. Circulation, 124(23), 2483–2490. https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.111.038422/-/DC1
Nuttall, F. Q. (2015). Body mass index: Obesity, BMI, and health: A critical review. Nutrition Today, 50(3), 117–128. https://doi.org/10.1097/NT.0000000000000092
Stokes, T., Hector, A. J., Morton, R. W., McGlory, C., & Phillips, S. M. (2018). Recent perspectives regarding the role of dietary protein for the promotion of muscle hypertrophy with resistance exercise training. Nutrients, 10(2). https://doi.org/10.3390/NU10020180,
Weinheimer, E. M., Sands, L. P., & Campbellnure, W. W. (2010). A systematic review of the separate and combined effects of energy restriction and exercise on fat-free mass in middle-aged and older adults: implications for sarcopenic obesity. Nutrition Reviews, 68(7), 375–388. https://doi.org/10.1111/J.1753-4887.2010.00298.X
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