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Principais erros na alimentação pré/pós-treino

Por Gonçalo Matias Santos

Nutricionista (6007N)


Uma preocupação comum para quem começa a treinar é saber o que deve comer antes e depois do treino. Embora seja difícil fazer recomendações específicas sem ter em conta o objetivo, a modalidade, a frequência e a intensidade dos treinos, é possível dar algumas orientações gerais para quem procura melhorar o rendimento desportivo (Thomas et al., 2016).



Em primeiro lugar, é importante perceber como o nosso corpo obtém energia para realizar movimentos em atividades de alta intensidade. As reservas musculares de hidratos de carbono, ou glicogénio muscular, são fundamentais para a produção de energia nesse contexto (“Nutrition and Athletic Performance,” 2016). Já a gordura, devido ao processo mais demorado que envolve o consumo de oxigénio, acaba por ser uma fonte menos relevante em atividades intensas.


No entanto, a refeição ou lanche que antecede o treino (até 2-3 horas antes) não terá grande impacto no preenchimento das reservas de glicogénio muscular, pois estas demoram entre 4 a 6 horas a ser repostas (Burke & Hawley, 2018). Ou seja, se alguém treina às 18h, um almoço completo por volta das 13h (com arroz, massa, batata, pão, etc.), terá mais impacto no preenchimento dessas reservas do que a refeição pouco tempo antes.


Além disso, é importante saber que o uso do glicogénio muscular depende exclusivamente dos músculos que estamos a trabalhar. Ou seja, quem treina, por exemplo, os membros inferiores na segunda-feira, pode perfeitamente treinar os membros superiores no dia seguinte, sem se preocupar em repor imediatamente essas reservas. O mais importante é garantir o consumo diário adequado de hidratos de carbono, o que, para praticantes regulares de musculação, se situa entre 3 e 5 gramas por quilograma de peso corporal (Kerksick et al., 2017).


Sabendo isto, o leitor provavelmente deve estar a questionar-se: “Então, para que serve a refeição pré-treino?”.


Quando falamos da refeição ou lanche pré-treino (30-60 minutos antes), a ingestão tem dois objetivos principais:

  • Fornecer glicose (“açúcar”) para o sangue, de forma a evitar sentir fome durante o treino (Thomas et al., 2016).

  • “Poupar” as reservas de glicogénio, especialmente as do fígado, para evitar sentir cansaço ou fraqueza durante o treino (isso pode variar muito de pessoa para pessoa) (Kerksick et al., 2017).


Um terceiro motivo para consumir hidratos de carbono antes do treino é que isso pode ajudar a evitar o aumento da resposta inflamatória – fator que prejudica a absorção do ferro. Em pessoas com risco de carência de ferro, essa inflamação pode contribuir para agravar ou precipitar uma anemia, o que torna a ingestão de hidratos de carbono uma medida importante para a saúde geral (Thomas et al., 2016), especialmente para aqueles em maior risco de serem afetados por essa carência, como mulheres com perdas expressivas de ferro devido à menstruação, atletas corredores com perdas de ferro por impacto (hemólise), pessoas que seguem uma dieta vegetariana ou que apresentam dificuldades de absorção por razões médicas ou medicamentosas.


Em termos de opções alimentares, é recomendável que a refeição pré-treino contenha hidratos de carbono com baixo teor de fibra, para garantir uma libertação rápida de glicose no sangue e evitar um possível desconforto intestinal (“Nutrition and Athletic Performance,” 2016). Algumas opções que funcionam bem são: uma saqueta de puré de fruta, uma banana, 3-4 tortitas de arroz/milho, fruta desidratada (como 2 tâmaras), entre outros. Contudo, se a pessoa se sentir bem a treinar sem consumir nada antes do treino, e ainda assim tiver um bom desempenho, em princípio não há problema em seguir essa abordagem.


Quanto à proteína antes do treino, ela não é obrigatória. Se for incluída, deve ser preferencialmente de rápida digestão (um batido de whey com fruta, por exemplo), e deve dar-se uma margem de “segurança intestinal” de pelo menos 60 minutos antes do treino. Fontes ricas em gordura, como carne, peixe, ovos e laticínios, podem não ser as mais indicadas neste contexto (Kerksick et al., 2017).


Em relação à ingestão de hidratos no pós-treino, é importante perceber que, num treino de musculação de 60-90 minutos, não se gastam as reservas de glicogénio muscular de forma significativa, a ponto de ser necessário fazer uma reposição agressiva. Esse tipo de reposição é mais relevante apenas para quem treina mais de uma vez por dia e repete os mesmos grupos musculares – situação que não se aplica a 99,9% das pessoas (Burke & Hawley, 2018).


De facto, a proteína tem uma função prioritária no pós-treino, dado que ajuda na recuperação e na síntese proteica muscular (Thomas et al., 2016). As fontes que mencionei anteriormente (como carne, peixe, ovos e laticínios) são perfeitamente adequadas para esse fim. Não há nenhuma vantagem em optar por batidos de proteína, além da conveniência. Quanto ao timing, o ideal é não permanecer mais de cinco horas em “jejum proteico” — ou seja, sem consumir alimentos que contenham proteína — após a última refeição com proteína. Uma refeição tradicional, como o almoço ou o jantar, com 20 a 40 gramas de proteína, é mais do que suficiente para servir como refeição pós-treino. Nesse contexto, a quantidade de fibras e gorduras não é uma preocupação (Kerksick et al., 2017).



Espero ter ajudado a elucidar-te sobre as principais questões que me colocam acerca da alimentação pré/pós-treino. Caso queiras melhorar o teu rendimento desportivo através de uma alimentação e, se necessário, suplementação adequadas a ti, podes sempre entrar em contacto para agendarmos a tua consulta de nutrição.



Referências

Burke, L. M., & Hawley, J. A. (2018). Swifter, higher, stronger: What’s on the menu? Science, 362(6416), 781–787. https://doi.org/10.1126/SCIENCE.AAU2093

Kerksick, C. M., Arent, S., Schoenfeld, B. J., Stout, J. R., Campbell, B., Wilborn, C. D., Taylor, L., Kalman, D., Smith-Ryan, A. E., Kreider, R. B., Willoughby, D., Arciero, P. J., VanDusseldorp, T. A., Ormsbee, M. J., Wildman, R., Greenwood, M., Ziegenfuss, T. N., Aragon, A. A., & Antonio, J. (2017). International society of sports nutrition position stand: nutrient timing. Journal of the International Society of Sports Nutrition, 14(1). https://doi.org/10.1186/S12970-017-0189-4

Nutrition and Athletic Performance. (2016). Medicine and Science in Sports and Exercise, 48(3), 543–568. https://doi.org/10.1249/MSS.0000000000000852

Thomas, D. T., Erdman, K. A., & Burke, L. M. (2016). Position of the Academy of Nutrition and Dietetics, Dietitians of Canada, and the American College of Sports Medicine: Nutrition and Athletic Performance. Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics, 116(3), 501–528. https://doi.org/10.1016/J.JAND.2015.12.006

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